Cuidados importantes na tributação do IR incidente sobre o ganho de capital na venda de imóveis rurais
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Publicado em 16 de setembro de 2020
Heráclito Higor Bezerra Barros Noé
Advogado Empresarial e Tributarista – Especialista em Direito Público e Tributário pela UFRN – Associado Amaral & Melo Advogados.
Cuidados importantes na tributação do IR incidente sobre o ganho de capital na venda de imóveis rurais.
No cotidiano dos produtores rurais é muito comum a compra e venda de propriedades, seja pela expansão do negócio com aquisição de novas áreas agricultáveis, ou mesmo com o intuito de investimento.
Nessas operações, é comum que a venda do imóvel rural ocorra por um valor maior do que o valor despendido na sua aquisição e é aí onde encontramos uma armadilha do fisco que tem afetado muitos produtores.
De um modo geral, nas alienações de bens imóveis, há a incidência do Imposto de Renda sobre o ganho de capital, cuja alíquota incide na diferença apurada entre o valor da alienação e o valor da aquisição do imóvel.
Como exemplo, se você possui uma casa que lhe custou cerca de R$ 300.000,00 e após um determinado tempo vendeu o mesmo imóvel por R$ 500.000,00, haverá incidência de IR sobre ganho de capital calculado sobre o valor de R$ 200.000,00, que será a base de cálculo do imposto, conforme acima destacado.
Ocorre que nas operações envolvendo imóvel rural há legislação específica, mais benéfica ao contribuinte, justamente pela importância do agronegócio para economia nacional e o desenvolvimento regional.
Com a edição da Lei nº 9.393/96, o imóvel rural cuja alienação ocorreu a partir de 01/01/1997 terá como base de cálculo para apuração do ganho de capital a diferença apurada do VTN (Valor da Terra Nua) do ano de alienação e do VTN do ano de sua aquisição.
Essa disposição específica é mais benéfica pois o VTN não leva em consideração as benfeitorias existentes, investimentos realizados com plantação, pastos, etc.
A título de exemplo, uma determinada propriedade rural adquirida em 2010 por R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais) e alienada em 2019 por R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), cujo VTN do ano da alienação era no valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), terá como base de cálculo a diferença do VTN do ano da venda (2019) menos o VTN do ano de aquisição (2010), que nesse exemplo era de R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais).
Dessa forma, utilizando a legislação especial para imóveis rurais, a base de cálculo do imposto sobre ganho de capital será de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), justamente a diferença entre o VTN do ano da Alienação e o VTN do ano de aquisição, e não sobre a diferença global entre o valor da compra e o valor total da venda, que no caso seria de 2 milhões de reais.
Com isso vemos uma enorme economia tributária e uma vantagem no tratamento dado pela legislação na venda de imóveis rurais, mais benéfica do que a incidente na venda de imóveis urbanos.
Apesar da determinação legal, a Receita Federal do Brasil editou a IN SRF 84/01 que tem gerado autuações fiscais equivocadas e consequentes embates jurídicos, pois a referida IN, a pretexto de regulamentar a Lei 9.393/96, aumentou a base de cálculo do referido tributo em determinada situação, qual seja, quando o contribuinte não tiver realizado a DIAT (Documento de Informação e Apuração do ITR) para fixação do VTN.
Nesses casos de não apresentação da DIAT seja no ano da alienação ou mesmo da aquisição, segundo a IN, a base de cálculo do imposto sobre ganho de capital seria a diferença entre o custo da aquisição e alienação, considerado globalmente, e não sobre o respectivo VTN, o que eleva sobremaneira o imposto a ser recolhido.
Ora, a Lei 9.393/96 instituiu a base de cálculo do imposto no seu art. 19, e a IN SRF 84/01 acaba por aumentar essa base de cálculo sem fundamento na lei, ou seja, um órgão administrativo inválida o comando legal, condicionando a aplicação do referido art. 19 a apresentação da DIAT, sem previsão em lei.
Essa situação acaba por afrontar o princípio da legalidade tributária, pois apenas mediante lei é possível instituir ou majorar tributos, bem como sua base de cálculo, o que não ocorreu no caso em tela, situação que denota a inconstitucionalidade da IN nesse ponto, em afronta ao art. 150 I da CF de 1988, que determina a competência exclusiva da lei para determinar base de cálculo do tributo.
Apenas a Lei e não mera instrução normativa, poderia alterar a base de cálculo do referido tributo, o que não aconteceu no presente caso, devendo sempre ser considerado o comando legal, estabelecendo aquela com sendo a diferença entre o VTN do ano da alienação e o VTN do ano da aquisição, independente da entrega ou não da DIAT.
Nesse sentido, importante que todos estejam atentos e não sejam surpreendidos com lançamentos de ofício de supostas diferenças do ganho de capital após realizarem venda de propriedades rurais, pois caso ocorra tal cobrança pelo fisco com base na IN SRF 84/01, desconsiderando o VTN pela não apresentação da DIAT para apurar o imposto devido, deve haver a pronta resposta, acionando o judiciário a declarar tal inconstitucionalidade, mantendo a legalidade tributária e a intenção do legislador em proporcionar tratamento tributário privilegiado para tais operações.